Quando a gente pensa que sabe todas as respostas,vem a vida e muda as perguntas

31
Ago 06

Uma das particularidades da crescente fraqueza do país tem a ver com a progressiva perda de importância e autonomia das organizações da sociedade civil. Por uma óbvia razão. A sociedade providência com um Estado em crise e debilitado financeiramente obedece cada vez menos ao que historicamente a determinou –e regulação do capitalismo, as lutas das classes laborais e os interesses cívicos das organizações associativas - e mais à iniciativa e tutela do Estado sob modelos e regras de gestão por este estabelecidos em troca do apoio financeiro público. Os direitos sociais -à cultura e ao desporto por exemplo - quase que são entendidos como uma benevolência e não como uma obrigação do Estado.As contaminações ideológicas ente desporto de representação e desporto de recreação ou entre criação cultural e industria do entretenimento cultural são o reflexo de uma intencionalidade política que introduz hierarquias e categorias que acentuam dicotomias que só tem explicação  na lógica burocrática e compulsiva de um Estado históricamente relapso, incapaz de reequacionar as mutações ocorridas nos últimos trinta anos. A consequência é uma inevitável perda de flexibilidade e autonomia das organizações associativas e a prazo o risco da sua conversão em organizações burocráticas e com graus de profissionalização, não para o que é a sua missão como organizações voluntárias, mas para responder às exigências da burocracia do Estado ( de tipo essencialmente administrativo e financeiro). O que não deixa de ser contraditório com o anúncio de medidas de simplificação e desburocratização do Estado e da administração pública. Mas a realidade aí está. A invisibilidade de muitas decisões e o peso dos burocratas no aparelho de Estado, agitando a bandeira da transparência e do rigor, sempre pouco aplicáveis ás suas práticas enquanto dirigentes, reforça os riscos de um crescente enquistamento das organizações que na sociedade civil cumprem funções de interesse público. O silêncio é o preço a pagar pelas organizações perante o receio de que em qualquer momento o apoio recebido possa ser suspenso.  

 

publicado por José Manuel Constantino às 09:26

30
Ago 06

Botocar é uma expressão brasileira que significa aplicar botox. E botox é um cosmético que os cirurgiões plásticos utilizam para melhorar a apresentação facial particularmente na área da testa e dos olhos. Muito utilizado por artistas e personalidades que têm uma forte exposição mediática, chegou a vez de ser um recurso utilizado pelos políticos. Segundo a imprensa brasileira o próprio presidente Lula da Silva tem sido submetido a tratamentos de botox tendo hoje uma face mais lisa, mais firme e mais jovem.O que, aliado a um realinhamento dentário que inclui uma prótese de porcelana para aumentar um canino mais curto que o resto da arcada dentária, e a aplicação de um ácido para eliminar o aspecto oleoso da pele, dá ao antigo sindicalista metalúrgico uma imagem diferente e para melhor. O sucesso tem sido tão grande que aumenta o número de políticos a recorrer às vantagens do botox replicando o que anos antes Sílvio Berlusconi já adoptara como uma verdadeira revolução nas práticas dos homens de Estado. Conhecendo-se a boa influência que os brasileiros têm nas diferentes assessorias que em Portugal se prestam a políticos e respectivos partidos não será surpresa que a onda chegue a Portugal. 

publicado por José Manuel Constantino às 11:27

29
Ago 06

O governo britânico acaba de nomear uma ministra para a forma física (fitness minister). Caroline Flint é o seu nome.Com a sua nomeação o governo britânico pretende lutar contra os níveis preocupantes de obesidade e espera que, com as medidas a adoptar - um programa diário de actividade física para a população - os britânicos se tornem pessoas mais saudáveis.”Fui nomeada à frente de um cargo que tem como objectivo estudar, junto a outros Ministérios, quais as políticas que podemos implementar para melhorar a qualidade da saúde da população", explicou. O que está correcto atendendo a que a obesidade tem causas multi-factoriais e a sua diminuição está muito para além da simples promoção da educação física ou do desporto como infelizmente é muitas vezes entendido. Elegante e charmosa, Caroline Flint, não prescinde da prática regular de actividades físicas orientadas para a saúde.. Vai, por isso, falar e apelar ao que faz. Nem podia ser de outro modo. A promoção da leitura não pode ter como referência alguém que não lê. A promoção da luta anti-tabágica alguém que fuma.Com a actividade física, com o exercício e com o desporto passa-se o mesmo. Em Portugal, por exemplo, o índice de sedentarismo dos portugueses baixaria significativamente se todos quantos dizem o que os outros devem fazer, começassem eles próprios por fazer. Até porque não há palavras que valham um bom exemplo.

 

publicado por José Manuel Constantino às 09:29

28
Ago 06

Não é com surpresa que assistimos ao que se diz e escreve sobre o chamado “caso Mateus”.Descontando as simpatias ou antipatias que o caso suscita e a apreciação a fazer a quem tem competências no âmbito desportivo e como as exerceu, subjacente à questão e seus desenvolvimentos está uma questão de fundo, permanentemente iludida, que é a de procurar fazer sobrepor disposições normativas de uma organização desportiva internacional ao direito dos estados nacionais em matérias que não são do foro estritamente desportivo ainda que com ele conexas. A Federação Portuguesa de Futebol teme a reacção da FIFA perante o recurso de uma sua filiada para os tribunais comuns os quais, refira-se, se sentiram competentes para ajuizar a matéria de facto e de direito. Mas parece não temer o efeito de não cumprir as decisões dos tribunais comuns cuja consequência, entre outras, seria o da suspensão ou cancelamento do estatuto de utilidade pública desportiva. A pergunta tem por isso pertinência: a que ordenamento jurídico se vai conformar a Federação Portuguesa de Futebol. O do seu País ou da organização internacional de futebol?

publicado por José Manuel Constantino às 11:41

25
Ago 06

Com manifesta regularidade a comunicação social utiliza informações que lhe chegam sobre investigações, inquéritos e outro tipo de procedimentos que ,por norma e face ao estado em que se encontram, deveriam ser reservados e do exclusivo conhecimento de quem por eles é responsável. O tema é conhecido, sabe-se quem pratica este exercício e o assunto está suficientemente diagnosticado e debatido. A comunicação social com livro de estilo ou sem ele, de referência ou tablóide, chama-lhe um figo! O visado fica fragilizado perante o caudal de notícias que sobre ele são vertidas sobretudo quando se trata de processos que envolvem investigações judiciais. E mesmo que passado uns tempos o que sobre ele se investiga  venha a ter um desfecho distinto do anunciado o ónus sobre a credibilidade pessoal está lançado e é dificilmente recuperável. É por isso humanamente compreensível que quem se  sente atingido e injustiçado reaja com os meios que tem à sua disposição. Mas poucos, incluindo titulares de cargos públicos, podem beneficiar à hora do almoço de um directo de doze minutos para expor os seus argumentos e razões, ameaçar o autor da notícia, invocar a necessidade de uma bengalada queiroziana, deslocar-se ao seu local de trabalho e ter a recebê-lo, entre outros, os dois mais proeminentes administradores da empresa titular do jornal. E à noite, num registo mais sereno e intimista, fazer o pleno em todos os canais televisivos. Nem o cidadão Luís Filipe Vieira.Só o Presidente do Benfica. É a ordem mediática.E a empresa de Cunha Vaz merece reconhecimento pelo bom trabalho feito.

 

E.T.

(1) O trabalho jornalístico ficaria completo se tivesse sido ouvida a entidade que denunciou não ter a verba do jogador dado entrada nos cofres do clube :a actual direcção do Alverca;

 (2) Luís Filipe Vieira invoca como motivo de frontalidade e coerência o facto de ser o único dirigente do futebol que denuncia o caso do Apito Dourado. Em nome da memória, presente e futura, recorda-se que quem assim fala é o mesmo dirigente que sempre votou favoravelmente no principal arguido desse processo, incluindo na última eleição recentemente realizada. Coerência ou falta de memória?

 

publicado por José Manuel Constantino às 09:30

24
Ago 06

A nomeação do Procurador Geral da República é da responsabilidade do Presidente da República sob proposta do Primeiro-ministro. A haver consenso quanto ao nomeado ele terá de ser encontrado entre quem propõe e quem nomeia. E quem propõe ouve quem muito bem entende e se para o efeito entender. Admitir que essa proposta deve resultar de um consenso entre quem propõe e o principal partido da oposição não tem qualquer suporte legal. A sua reclamação, mesmo em nome de uma eventual tradição, surge como uma forma de pressão sobre quem propõe e quem nomeia. Um assunto desta importância e natureza deveria ser tratado com discrição, reserva e sentido de responsabilidade. Nada impede o Primeiro –ministro,  se assim o entender, de ouvir os partidos políticos. Exigi-lo na praça pública é abusivo. Colocá-lo na agenda política como o fez o PSD e nos termos em que o fez  é uma forma de desprestigiar, desqualificar e politizar uma figura que, pelas suas responsabilidades, exigiria um outro sentido de exigência cívica .O Estado e as suas instituições correm o risco da instrumentalização de um cargo que pela sua natureza deveria estar acima de qualquer disputa partidária.

publicado por José Manuel Constantino às 10:01

23
Ago 06

Carlos Sousa foi eleito Presidente da Câmara Municipal de Setúbal. O partido político que o candidatou, face à avaliação que faz do seu trabalho, tem toda a legitimidade política para lhe solicitar a renúncia ao respectivo mandato. Mas não tem qualquer legitimidade para no seu lugar colocar uma outra pessoa para o exercício de uma função para a qual não foi sufragada. A senhora pode ser uma excelente pessoa e uma óptima presidente de câmara.Mas devia ser obrigada a ir a votos buscando a legitimidade política onde ela está: nos eleitores e não na comissão concelhia do PCP. O que se está a fazer em Setúbal é alienar a vontade do eleitorado e substituí-la pela vontade do partido. É um golpe na legitimidade política e eleitoral dos órgãos autárquicos. A solução é só uma: independentemente dos motivos, sempre que existe abandono de funções de Presidente de uma Câmara Municipal, cargo cujo exercício é previamente sufragado, dever-se-iam realizar novas eleições. Coisa que o PCP, no caso vertente, lhe não interessa e o PS e o PSD o requerem por mero oportunismo político. Sem ir muito longe e não esgotando os exemplos, recordemos o que se passou em Lisboa com Jorge Sampaio e mais tarde Pedro Santana Lopes. A diferença está apenas nos motivos do abandono, mas a ilegitimidade política é idêntica: o exercício de funções por parte pessoas que não foram eleitas para esse efeito.O resto é pura retórica jurídica.

publicado por José Manuel Constantino às 12:56

22
Ago 06

A polémica em torno da publicitação ou não, em Diário da República, das contratações de pessoal para os gabinetes ministeriais e para a administração pública deve-se a clara aselhice do Governo. Convidado a explicar a decisão o Secretário de Estado da Administração Pública caiu no jogo de um certo jornalismo e de uma oposição demagógica  que viram logo, na eventual não publicitação, uma forma de esconder o compadrio político de certas nomeações. Admitir que através da publicitação em Diário da República, será possível de contrariar ou diminuir as contratações na administração pública por critérios de mera conveniência política é uma patetice. Em primeiro lugar, porque a sua publicitação nunca foi impeditiva das contratações por “critério político” como está abundantemente demonstrado bem como as remunerações avulsas, muitas delas superiores a equivalentes categorias do pessoal dos quadros e até de dirigentes. Em segundo lugar, porque um jornalista, um cidadão ou um político está sempre em condições de solicitar a qualquer organismo da administração pública a lista actualizada dos respectivos contratados e os correspondentes vencimentos. O sistema actual só serve para alimentar alguma voracidade jornalística, parte dela sem qualquer critério ou pudor, como ainda recentemente se verificou a propósito da filha de Jorge Sampaio. O problema é outro, é antigo e de maior dificuldade de resolução: a escassez em alguns sectores da administração pública de técnicos qualificados, os constrangimento a novas admissões e o recurso a “avençados”,com um simulacro de consulta ao mercado, para solucionar as necessidades dos serviços; o abandono em muitos sectores da administração pública central e local de critérios de selecção mérito e de capacidade profissional para servir o Estado. A publicitação em Diário da República não resolve, nem pode resolver, uma questão que, num caso, está inscrita na lógica e na cultura dos partidos políticos a quem são atribuíveis funções de governação e, no outro ,resulta de uma administração pública completamente desajustada às missões do Estado que é suposto servir. Discutir a publicação ou não em Diário da República é perfeitamente irrelevante para a questão de fundo.

publicado por José Manuel Constantino às 09:41

21
Ago 06

Vivo num concelho com 42 quilómetros quadrados e 150.000 habitantes. Um concelho que dispõe de 7 associações de bombeiros voluntários. São associações de bombeiros voluntários embora esta realidade esconda uma outra: uma percentagem significativa é remunerada e todos usufruem do estatuto social do bombeiro que em algumas matérias, como a aposentação, tem significativas vantagens relativamente às do vulgar cidadão. Não discuto a razoabilidade e justiça das regalias sociais. Destaco a situação para estabelecer a diferença com outros tipos de voluntariado que não recebem qualquer contrapartida social. Todos pretendem estar devidamente equipados incluindo naturalmente dispor de quartel o qual não pode ser inferior ao da associação vizinha. O suporte financeiro a esta actividade tem origem basicamente em dinheiros públicos. Interrogo-me se a acção de socorro não seria preferível com uma única corporação municipal, com economia de custos, gestão de comando e ganhos de eficácia e eficiência na missão pública. Creio contudo que em nome da dedicação e abnegação de muitos homens e mulheres que escolhem o serviço de bombeiros há um enorme melindre social em enfrentar esta realidade. Como existe um silêncio total sobre a qualidade do serviço que o voluntariado presta, por exemplo, no combate aos incêndios. Sabemos que há deficiências na gestão do parque florestal, nas medidas preventivas e que existem incendiários. Mas não sabemos qual é avaliação ao desempenho dos voluntários no combate aos fogos e se um sistema distinto não seria de menores custos e de maior eficácia. O voluntariado nesta como em outras actividades sociais é um benefício que a sociedade recebe. Mas não é necessariamente sinónimo de qualidade. E numa situação tão dramática como é a dos incêndios, o país tem de saber escolher.

publicado por José Manuel Constantino às 09:27

18
Ago 06

Creio que foi António Alçada Baptista que escreveu ” que caminhamos inexoravelmente para a solidão e o nosso futuro é o esquecimento”.Calcorreando a Lisboa nocturna vemos homens e mulheres sós e abandonados dormindo na rua. Mas vemos também pessoas que ,pelo menos aparentemente, aguardam apenas que o tempo passe, ora divagando sem destino um centro comercial, ora tendo apenas por companhia uma animal de estimação. O que pensamos quando falamos em solidão? Será sinónimo de infelicidade ou existirão solitários felizes? A solidão é um sentimento vivenciado quando se está fisicamente só ou quando se vive socialmente excluído? A solidão é  a consequência do abandono, da exclusão, da velhice ,da droga, da perda de laços familiares ou pode ser também a consequência de uma individualidade que reclama estar só? A solidão parece ter vários rostos e vários motivos. Mas é em muitas circunstâncias a vitória da descrença sobre a esperança. E a aceitação da solidão como destino.”Nos rastos da solidão” é uma deambulação sociológica de um autor, José Machado Pais, de leitura recomendável em qualquer época do ano.

publicado por José Manuel Constantino às 09:38

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Autor: JOSÉ MANUEL CONSTANTINO
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