No Liceu o meu professor de desenho e trabalhos manuais obrigava os alunos a comparecerem de gravata. E se apresentavam camisola de gola alta baixava a gola para verificar se por baixo estava colocada a gravata. A quem a não tinha aplicava falta de material. Era uma excepção naquele liceu. Mas não era excepção, mas regra obrigatória, a proibição das raparigas usarem calças.
Os tempos mudaram. Tanto que quando na universidade fui professor, alguns alunos tinham por hábito surgir nas aulas de boné na cabeça. Explicava-lhes que fui educado e habituado a outras regras e que nas minhas aulas não permitia alunos com aquele modo de se apresentarem. Nunca nenhum se recusou a cumprir a minha orientação ou sequer a questioná-la. Nunca perguntei, mas pensei para comigo: se nas minhas aulas se apresentam de chapéu na cabeça provavelmente há outras aulas onde isso também ocorre. E, porventura, onde esse modo de se apresentar é admitido pelos meus colegas. Se o não fosse o normal seria retirarem o boné da cabeça sempre que entram na sala de aula.
Tudo isto a propósito de uma universidade (a Católica) ter sentido a necessidade de emitir uma orientação sobre o modo como os seus funcionários, professores e alunos se apresentam vestidos atendendo a que os hábitos actuais levam a que muitos se apresentem como se fossem para a praia. Embora muitos outros, optem por um vestuário, aos meus olhos, igualmente bizarro mas de tradição académica (capa e batina).
Em algumas décadas passámos dos oito para os oitenta. De um rigor absolutamente despropositado para um laxismo de equivalente sentido.
O modo como nos vestimos é sempre sinal da época em que vivemos. Mas esse modo também não pode ser indiferente ao que fazemos e aos espaços e instituições que frequentamos. E aí pode ser tão absurdo a rigidez como o laxismo das regras. Como em tudo na vida uma boa dose de bom-senso é quanto basta. E o bom-senso não se legisla. Pratica-se pelo bom exemplo. E na escola ele deve começar por quem a dirige e pelos próprios professores. No modo como se apresentam. E nas regras que criam aos seus próprios alunos. E estabelecendo a diferença entre um local de trabalho e um local de recreio.
Publicado na edição de hoje do Primeiro de Janeiro