Não é novidade para ninguém que o país precisa de medidas que equilibrem as contas públicas e reduzam a dívida externa quer do Estado, quer dos privados. E que, num contexto em que houve necessidade de recorrer a ajuda externa a governação está, em parte, presa às condições que acordou para poder receber essa ajuda.
As medidas quer de aumento de impostos, quer do valor de aquisição de bens e serviços essenciais, penalizam, por isso, a generalidade dos cidadãos, mas prejudicam acima de tudo os que dispõem de menores recursos financeiros.
As opiniões dividem-se sobre a natureza e a profundidade das medidas. E alguns questionam a via de primeiro empobrecer ainda mais o país e só mais tarde curar do seu crescimento. Porque o esforço será bem maior dado que o ponto de partida será mais baixo. Mas até aqui estamos no domínio da política e no confronto entre diferentes modos de enfrentar e sair da crise.
O que surpreende é que num quadro de empobrecimento crescente dos portugueses e com níveis elevados de desemprego existam governantes que anunciam cada nova medida de austeridade rindo-se como se de uma festa se tratasse. Não se espera que chore, mas exige-se que tenha presente que está a mexer com a vida das pessoas e as respeite.
Longe vai o tempo em que Pedro Passos Coelho, então líder na oposição, pedia desculpa aos portugueses por ter andado a dizer uma coisa e depois comprometer-se com outra, com o governo de então. Era um acto de humildade, raro em política, mas que demonstrava a franqueza de reconhecer que não era possível defender ser levado a sério andando a dizer uma coisa e a fazer outra.
Nos tempos que correm já é pedir muito que se respeitam os compromissos assumidos. Mas não é pedir de mais, que exista alguma sensibilidade social e alguma preocupação humanística, quando se anunciam medidas que se sabe vão penalizar pessoas e famílias e onde o ambiente é mais de festa
Será pedir muito que tenham presente que cada medida, cada reforma, atinge pessoas, fere dignidades e abala sonhos e projectos? Será que a social- democracia e a democracia -cristã se limitam a uma governação de engenharia financeira onde já não há lugar para a dignidade da pessoa humana, nem para a esperança de uma vida mais digna?
Publicado na edição de hoje do Primeiro de Janeiro