O Presidente da República terá razões para escrever o que escreveu a propósito de José Sócrates. Mas mais importante do que fazer um juízo de valor sobre o que o Presidente da República acaba de escrever em relação a um ex-primeiro ministro é discutir a sua oportunidade. E claramente, aqui, o Presidente da República errou.
O país vive uma delicada situação social fruto de constrangimentos financeiros muito graves que o obrigaram a recorrer a uma ajuda externa em condições de extrema severidade. Os partidos que assinaram os termos dessa ajuda tudo devem fazer para minorar os seus efeitos. E nenhum deles pode lavar as mãos na responsabilidade pela situação atingida. Não podem deixar de ser solidários com o que assinaram.
O exercício presidencial deve fomentar esse sentido de responsabilidade evitando sentimentos de reserva ou de quebra à prática dessa responsabilidade. O que obriga o Presidente da República não a estar acima de questões políticas domésticas mas a geri-las de modo a não acrescentar problemas aos problemas já existentes. Deve para tanto ser um fator de aproximação e o seu exemplo valerá por mil palavras. Colocar no espaço público o modo como um ex-governante se posicionou em relação a esta ou aquela matéria é um risco muito elevado para a magistratura presidencial. Mas também para a defesa da dignidade do cargo. Que requer prudência e discrição e dispensa polémicas que, nesta altura, pouco acrescentam, à governabilidade do país.
O nosso caminho é estreito. Pouco ganharemos se não nos concertarmos no essencial. O país precisa de um Presidente da República que atente à realidade social e que ajude aos seu atores políticos e sociais a superar as dificuldades. Dispensa um presidente que avoque o ajuste de contas por mais razões que lhe assistam. Dificilmente o pais ganhará com discussões à volta da responsabilidade deste ou daquela ator político que os portugueses avaliaram e julgaram, quando votaram. Provocar José Sócrates é, de um modo ou de outro, provocar o PS.É, neste momento, um exercício dispensável para o país. E o Presidente da República não deve alimentar este tipo de polémicas.
Cavaco Silva nas suas memórias políticas terá então oportunidade de escrever o que por bem entender e, porventura, acrescentar algo mais. Mas não, agora, como Presidente da República.
Publicado na edição de hoje do Primeiro de Janeiro