O estatuto e a respeitabilidade de quem exerce cargos de natureza pública requerem reserva e discrição. A sua constante exposição aos tempos e às regras da sociedade mediática degradam a imagem que se cria a respeito das pessoas que exercem esse tipo de funções. O recurso a comentadores políticos de pessoas que no passado tiveram responsabilidades partidárias e atualmente exercem funções de responsabilidade pública é um trunfo mediático. Mas com elevados riscos.
O comentário político tornou-se um exercício competitivo. De audiências e de revelações. E de ajustes de contas. O comentário deixou de ser para analisar o que ocorreu mas também para cenarizar o que vai acontecer. E neste terreno ganhar ao outro comentador. O frenesim em divulgar algo que supostamente deveria ser de conhecimento restrito impressiona. Para tanto disputam-se as fontes e cada um tem os seus canais/informadores privilegiados. Não passa uma semana em que não revelem o que deveria ser reservado. A obsessão por aparecer em tudo o que é mediaticamente relevante complica. Os seus amores e dos seus ódios não são esquecidos. Alguns rivalizam com outras figuras que regularmente ocupam o espaço comunicacional. Disputa-se a sua presença em colóquios, conferências e lançamentos de livros. Tornaram-se um novo nicho do mercado de tudo quanto é mídia. É indisfarçável a atracção que o espaço mediático sobre eles exerce e a irreprimível tentação de participar na rave da democracia. Parte desses novos e velhos opinadores procuram recuperar o tempo quando perderam na militância política e partidária. Fazem política, de que só formalmente se afastaram, por outros meios.O poder político assiste a tudo isto com complacência e, debilitado como está, receia, tem medo, de, como no passado, ser acusado de interferir na “autonomia” dos comentadores. Tudo funciona em regimes de recados e os nossos comentadores lá vão fazendo a sua política. Mesmo sem mandato. Não é novidade. Mas convém lembrá-lo.
Publicado na edição de hoje do Primeiro de Janeiro