Num momento particularmente difícil da vida do país e dos portugueses o que no espaço público se escreve ou se diz, deve merecer cuidada ponderação. O grau de tolerância é menor e tudo quanto seja sentido como menos respeitador da vida das pessoas é facilmente inflacionado e fruto de polémicas. Certo tipo de afirmações corre o risco de provocar danos que estão para além dos propósitos dos seus autores. E, por isso, todo o cuidado é pouco
Fernando Ulrich, banqueiro, é um ex-jornalista. Em bom rigor não sei se se pode dizer deste modo, mas pelo menos é alguém que durante alguns anos escreveu nos jornais. Tem sobre muitos outros a experiência de comunicar. E é uma pessoa com experiencia de vida. Estranha-se, por isso, que, com um hábito que começa a ser preocupante, decida dizer o que lhe vai na alma, num tom e num registo que suscita inúmeras polémicas.
Para se defender uma causa não é preciso ser grosso. Não é preciso colocar um ar grave, sisudo e zangado com receio de que o efeito do que se diz não seja alcançado. Ser rico e estar bem na vida não permite tudo. Nem outorga uma espécie de superioridade moral sobre os outros. A dignidade e o respeito humanos são equivalentes para todas as pessoas independentemente do seu estatuto social.
É óbvio que Fernando Ulrich é livre de dizer o que pensa e do modo que entende melhor. Mas talvez não fosse pura perda de tempo refletir se o tom altivo e sobranceiro que habitualmente utiliza é compatível com as funções e responsabilidades sociais que tem, ainda que no domínio da uma atividade privada como é a sua ação de banqueiro. O modo como se dirigiu aos deputados, que dispõem de uma legitimidade e representatividade públicas que ele não reúne, deveria ser fator de respeito. E não foi. E o ar displicente e de suposta superioridade com que fala da sua formação é mais próprio de quem julga que não tem satisfações a dar do que faz e do que diz. Mas tem. E não é o facto de exercer uma atividade privada que o iliba dessa responsabilidade. Bastaria que se lembrasse que ao invocar a sua formação como católico cria uma responsabilidade social e cívica conforme a doutrina que invoca. Ou não?
Publicado na edição de hoje do Primeiro de Janeiro